O céu
estava cinzento e quase nunca aparecia o sol, mas enquanto não chovia os
meninos iam brincar para o jardim.
Um jardim
muito grande e bonito, com uma grade pintada de verde toda em volta, de modo
que não havia perigo de os automóveis entrarem e atropelaremos meninos que
corriam e brincavam à vontade, de muitas maneiras: uns andavam nos baloiços e
nos escorregas, outros deitavam pão aos patos do lago, outros metiam os pés por
entre as folhas secas e faziam-nas estalar – crac,crac - debaixo das botas,
outros corriam de braços abertos atrás dos pombos, que se levantavam e fugiam,
também de asas abertas.
Era bom
ir ao jardim. E mesmo sem haver sol, os meninos sentiam os pés quentinhos e
ficavam com as bochechas encarnadas de tanto correr e saltar.
Uma vez
apareceu no jardim uma menina diferente: não tinha bochechas encarnadas,
mas uma carinha redonda, castanha, com dois grandes olhos escuros e brilhantes.
- Como te
chamas? - perguntaram-lhe.
-
Maria. Às vezes chamam-me Maria Castanha.
-
Que engraçado... Maria Castanha! Queres brincar?
- Quero.
Foram brincar
ao jogo do apanhar. A Maria Castanha corria mais do que todos.
-
Quem me apanha? Ninguém me apanha! Ninguém apanha a Maria Castanha!
Ela
corria tanto. Corria tanto que nem viu o carrinho do vendedor de castanhas
que estava à porta do jardim, e foi de encontro a ele. Pimba! O saco das
castanhas caiu e espalhou-as todas à reboleta pelo chão. A Maria Castanha caiu
também e ficou sentada no meio das castanhas.
-
Ah. Minha atrevida! – gritou o vendedor de castanhas todo zangado.
-
Foi sem querer – explicaram os outros meninos.
-
Eu ajudo a apanhar tudo. – disse Maria Castanha, de joelhos a apanhar as
castanhas caídas.
E
os outros ajudaram também. Pronto. Ficaram as castanhas apanhadas num
instante.
-
Onde estão os teus pais? – perguntou o vendedor de castanhas à Maria
Castanha.
-
Foram à procura de emprego.
- E tu?
-
Vinha à procura de amigos.
- Já
encontraste: nós somos teus amigos – disseram os meninos.
-
Eu também sou – disse o vendedor de castanhas.
E pôs
as mãos nos cabelos da Maria Castanha, que eram frisados e fofinhos como a lã
dos carneirinhos novos. Depois, disse:
-
Quando os amigos se encontram, é costume fazer uma festa. Vamos fazer uma
festa de castanhas. Gostam de castanhas?
-
Gostamos! Gostamos! – gritaram os meninos.
- Não
sei. Nunca comi castanhas, na minha terra não há. – disse Maria Castanha.
- Pois
vais saber como é bom.
E o
vendedor deitou castanhas e sal dentro do assador e pô-lo em cima do lume. Dali
a pouco as castanhas estalavam… Tau! Tau!
- Ai, são
tiros? – assustou-se a Maria Castanha, porque vinha de uma terra onde havia
guerra.
-Não
tenhas medo. São castanhas a estalar com o calor.
Do assador
subiu um fumozinho azul-claro a cheirar bem. E azuis eram agora as castanhas
assadas e muito quentes que o vendedor deu à Maria Castanha e aos seus amigos.
-
É bom, é. – ria-se Maria Castanha a trincar as castanhas assadas.
- Se me
queres ajudar, podes comer castanhas todos os dias. Sabes fazer cartuchos de
papel?
A Maria
Castanha não sabia mas aprendeu. É ela quem enrola o papel de jornal para fazer
os cartuchinhos onde o vendedor mete as castanhas que vende aos fregueses à
porta do jardim.
António Torrado, Maria
Castanha
Sem comentários:
Enviar um comentário